5. Ramal Paraisópolis, a magia do Túnel CruzVera


No dia 25 de setembro de 2021 estivemos na cidade de Paraisópolis. Eu tinha feito o contato prévio com o Sr. Toninho, funcionário da Biblioteca Municipal da cidade.  Esse foi um dos momentos mais especiais nessa jornada de memórias. Eu e meu pai saímos de Pouso Alegre,  por volta de 07:00, e viemos em uma bela manhã de sábado conversando sobre o tamanho da antiga área de jurisdição da cidade de Paraisópolis, já que Cachoeira de Minas e Conceição dos Ouros, eram vilas de Paraisópolis. 

Marco do ramal Paraisópolis está a Pedra da Cruz ou "Falésia dos Olhos" situada no Distrito de Cruzvera. Cruzvera significa "cruz verdadeira" e este marco, que dá nome ao distrito, tinha uma estação ferroviária (Km 35) e um túnel próximo. Imagem Drone Nov/2022 Projeto Memórias de Maria


Eu havia feito um estudo com os mapas da região de Rennó, região próxima a região de Santa Rita do Sapucaí, e observamos que no Album Chorographico (1927), existe referência que a extensão territorial de Paraisópolis englobava a Estação do Rennó, hoje pertencente a Cachoeira de Minas. Na estação Rennó, nome da uma antiga fazenda no local, havia uma extensão territorial em "forma de bico" (mapa abaixo) que englobava a antiga estação ferroviária. Hoje a localidade pertence a Cachoeira de Minas.

Mapa do Município de Paraisópolis. É possivel observar no mapa de 1927 (reprodução) que as VILLAS de Cachoeira, Ouros, Capivary, Gonçalves e Sapucahy-Mirim pertenciam a Paraisópolis. Foto: Album Chorographico (1927).


Quando cheguei em Paraisópolis fomos recepcionados pelo Sr. Antônio Benedito Andrade de Almeida, conhecido como Toninho Almeida, que trabalha na biblioteca municipal. Junto a ele estavam dois jovens acadêmicos; Jhonnathan Leonardo e Vinícius Rezende. Posteriomente chegaram; o escritor Cláudio Domisciano de Oliveira e o Sr. Cléber Alexandre da Silva. 

Encontro do dia 25 Set 2021 na cidade de Paraisópolis. Participaram do encontro: Acadêmico Vinícius, escritor Cláudio, acadêmico Jhonnathan, Professor Toninho Almeida, Senhor Cléber Alexandre e meu pai Vitor Roberto Fraga.


Fizemos uma manhã de debates de temas variados temas relacionados com a memória ferroviária do município. Posteriormente o Senhor Cléber, representante do departamento de Cultura de Paraisópolis, nos convidou para conhecer a estação ferroviária da cidade. A bela estação ferroviária de Paraisópolis encontra-se em bom estado de conservação, mantida as características da década de 1930.

Estação da Paraisópolis, estação final do ramal Paraisópolis, localizada no Km 51 do ramal, que se iniciava na cidade de Piranguinho. Foto do site: Estações Ferroviárias

Estação de Paraisópolis (Km 51), ponto final do ramal. Existem referências que a estação foi inaugurada em 1912, mas o bonito prédio (foto) inaugurado em 1914, na tutela da rede Sul Mineira. A referência na fachada (RMV) já é sob tutela da Rede Mineira de Viação (1931). Na foto: Meu pai (esquerda), Sr. Cláudio, Sr. Cléber e eu.

O escritor Cláudio nos acompanhou naquela manhã. Fizemos algumas imagens do local da antiga estação e fomos posteriormente conhecer a ponte de ferro de Paraisópolis. Cláudio nos contou que a ponte está localizada sobre o rio Sapucaí Mirim.

Ponte de ferro sobre o Rio Sapucaí Mirim localizada próxima ao Município de Paraisópolis. A ponte de ferro com base de pedra semelhante ao modelo utilizado nas pontes de Piranguinho, Pouso Alegre e Soledade de Minas.

Ponte de ferro no antigo leito ferroviário, sobre o Rio Sapucaí Mirim. A ponte se localiza entre o túnel de Cruz Vera  e a estação final do ramal (Paraisópolis). A característica da ponte é semelhante, inclusive nas dimensões, a ponte de ferro de Brazópolis.

Ponte de ferro, próxima a Paraisópolis. Ponte tinha um eixo central de sustentação, composto de pedras. Na época da foto (Setembro/2021), período de seca. A ponte é de modelo Inglês. Na foto: Meu pai e o Sr. Cláudio.

Encerramos a manhã conhecendo o imponente túnel ferroviário de Cruz Vera localizado na divisa dos municípios de Brazópolis e Paraisópolis. Visitamos o túnel pelo lado do município de Paraisópolis. Existe na localidade, cerca de 200 metros antes da entrada do túnel, uma base de pedras, à direita, onde se encontrava a caixa d`àgua.

Entrada do Túnel de Cruz Vera, visão do alto, lado do município de Paraisópolis.
Local onde se encontrada a caixa d'água, localizada 200 metros a esquerda, após o túnel, sentido Paraisópolis.


Túnel de Cruz Vera. É possível observar o aspecto das pedras de "Cantaria", arte de talhar blocos de rocha bruta de forma a constituir sólidos geométricos. Foto de Novembro de 2022/ Projeto Memórias de Maria

Meu pai contava que certa vez ele e meu avô, foram visitar alguns parentes em Paraisópolis, e meu pai queria voltar de trem , pois já corria alguns boatos que  o ramal de Paraiso iria fechar.   Então eles partiram no trem MZ-4 (misto) de Paraisópolis as 7 horas da manhã e a locomotiva  parava nessa caixa d'água para abastecimento, e enquanto a ela "tomava água",  um sitiante  vizinho a linha montava uma mesa do lado de dentro da cerca e vendia toda a espécie de quitutes para os passageiros. Ele contava que essa mesa era coberta com uma toalha muito elegante  e eram vendidos aos passageiros, bolo de fubá, pães de queijo, queijos, broas, café com leite, leite com chocolate, biscoitos de polvilho tudo de produção artesanal dele. O maquinista até "segurava" um pouco o trem para dar tempo dos passageiros terminarem  o lanche, e que muitas pessoas compravam para "enfrentar" a viagem quando  seguia para destinos distantes. E quem não quisesse fazer um lanche, poderia aproveitar para pegar água pois tinha um cano que era servido pela mesma água que abastecia a caixa e era útil para matar a sede dos passageiros! Depois da "breve" parada, todos saciados, da locomotiva aos passageiros a viagem proseguiu e as 9:20 a composição chegou a estação de Piranguinho. Meu pai falou que pouquissimo tempo depois chegou a informação que o Ramal de Paraisópolis foi fechado, e ele teve  a triste honra de viajar em um dos últimos trens que percorreram a linha!  Abraços Ricardo! ( Texto: Daniel Paiva Santos, em referência a caixa d'água próxima ao túnel cruzvera. Daniel é filho de Tarcísio Silva Santos, grande entusiasta da memória ferroviária no sul de minas, e neto de João Silva Santos, ex-ferroviário)


Curiosidades do ramal Paraisópolis:

No dia 06 de novembro de 2021 eu tive a oportunidade de conhecer, na cidade de Itajubá, o Cap José Dias, ex-combatente, que foi nomeado, na década de 1960, delegado de serviço militar em Paraisópolis. Cap Dias nos deu depoimento contando que foi trabalhar em 1964 de trem, saindo de Itajubá e que, na Estação de Paraisópolis, ao final do dia de trabalho, foi surpreendido com a notícia da extinção súbita do ramal. Existem referências que o ramal Paraisópolis foi erradicado em 22 de maio de 1964.

Cap José Dias (centro).Cap Dias foi delegado do serviço militar em Paraisópolis e foi testemunha da extinção do ramal em 1964.  Foto em 06/11/2021. 

Existem algumas informações que o Túnel de Cruzvera foi aberto pelo empreiteiro português José Manoel da Costa, especialista em dinamitar pedreiras, que contratou cerca de 200 homens para essa obra no Cruzvera. Teria sido ele o mesmo empreiteiro que fez um novo bueiro na volta da bacia entre Maria da Fé e o bairro do Pedrão (1926) para suportar grandes volumes de água prevenindo acidentes como o ocorrido naquele mesmo local. Essa informação foi citada pelo pesquisador Alexandre Pereira Machado.

No entanto cabe ressaltar que o nome A. Leite possivelmente seja referência ao nome de Abrahão Leite,  diretor da Rede Sul Mineira, citado em telegrama identificado nesta pesquisa. Veja no texto " O maior acidente ferroviário do Sul de Minas".

O português Manoel de Oliveira Leite teria sido o responsável pela reconstrução do trecho próximo ao Pedrão após o acidente de 25/03/1925. Existe uma data que está em alto relevo acima da entrada do bueiro (08/09/1926). Possivelmente a data de entrega final da obra na região do Pedrão. O nome A. Leite possivelmente seja referência ao diretor da Rede Sul Mineira Abrahão Leite.


(Texto editado e escrito por Ricardo Fraga para o Documentário Memórias de Maria)

Veja também: "Estação Dias a Cruzvera, os caminhos do ramal Paraisópolis".

Veja também: "O maior acidente ferroviário do Sul de Minas".

Comentários

Caminhos do Trem

36. Freitas, Km 106; Silêncio e saudade às margens do Rio Verde.

35. O Ramal São Gonçalo do Sapucaí.

Escritor de Carvalhos-MG lança livro que resgata a memória ferroviária no Sul de Minas.

12. Porto Sapucaí, vetor de integração do modal ferroviário e fluvial.

37. Os mistérios e encantos do Km 24 do ramal Delfim Moreira.

1. Imbuia: o começo da pesquisa ferroviária.

8. Estação Dias a Cruzvera, os caminhos do ramal Paraisópolis.

11. De Bogari a Francisco Sá, pelos caminhos do ramal Sapucaí.

33. De Ouro Fino a Santana do Sapucaí, rotas primitivas nos caminhos do descoberto.